Thelma aprendeu cedo que, se quisesse conquistar qualquer coisa na vida, precisaria batalhar muito. Obstinada, ela jamais esmoreceu. E olha que foram muitos os percalços dessa médica anestesiologista de 35 anos, que está no grupo da Pipoca. “Criei ela para vencer, mas nunca imaginei que ela chegaria na Globo”, diz Dona Yara, cheia de orgulho, ao saber que a filha iria entrar no BBB20.
A batalha para se formar em Medicina foi concluída com sucesso, mas o caminho foi longo – e árduo. Sem dinheiro para pagar a faculdade, estudou dia e noite durante três anos para passar no vestibular:
“Levei muita paulada nas provas. Quando desisti, acabei passando”.
Com bolsa de 100% em uma faculdade particular, precisou mudar de cidade para realizar o sonho. Perrengues? Tiveram vários. “Primeiro, morei em uma pensão. Só levei uma caneca, um garfo e algumas roupas. Me virava com R$ 300 por mês. Só não passei fome. De resto, teve tudo que você possa imaginar”, conta, lembrando que nunca comprou um livro e não tinha nem um estetoscópio para as aulas práticas.
Sentiu na pele várias vezes o preconceito das pessoas por estar quebrando barreiras:
“Tanto na dança como na Medicina, sempre fui a única negra nos meus grupos”.
Sem perceber, tentou se encaixar no padrão imposto pelo meio em que vivia como, por exemplo, alisar o cabelo. Há três anos, decidiu assumir seus cachos e passou por uma transição capilar e se reencontrou:
“A minha história é parecida com a de muitas meninas negras. Odiava meu cabelo, então alisava. Nem lembrava mais como ele era sem química".
"Um dia me revoltei e passei a tesoura. Foi minha libertação. Ele ficou black power, mas eu tinha vergonha de usar tranças. Não tinha coragem de usar esse cabelo na faculdade. Hoje em dia eu vou com esse look para o hospital”.
Toda sua luta ficou mais leve quando conheceu Denis, seu marido. Na época da faculdade, o mecânico passou a lhe ajudar financeiramente: “Ele escondia dinheiro na minha mochila, trocava um programa a dois para pagar uma conta minha na república. Foi meu anjo da guarda”.
Discreto, o ex-mecânico – que estudou e se formou em fotografia a pedido da esposa – observa Thelma arrumar as malas para o confinamento com um misto de alegria e ansiedade. “Estou com um frio na barriga que não sei explicar”, assume. Foi ele quem inscreveu a médica no programa. “No começo não botei muita fé, mas depois que a chamaram para a seletiva que me deu o estalo”, comenta, interrompendo o papo para lembrar a esposa de pegar uma peça de roupa que ela gosta, um acessório mais quente para não passar frio ou algo de higiene pessoal.
Juntos há dez anos, eles se conheceram na rua quando Thelma voltava de outra paixão de sua vida: o samba. Quando não está dando plantão em um dos quatro hospitais onde trabalha, está sambando na quadra da Mocidade Alegre.
“Comecei na Bateria tocando chocalho, participei um ano da Comissão de Frente e agora sou passista do grupo de elite da escola”.
A relação com a dança vem de outros carnavais. Bailarina formada, deixou a companhia em que se apresentava quando ingressou na faculdade. “Não tem um dia que não dance. Danço no chuveiro, dentro do carro no meio do trânsito. O único dia que não dancei foi quando meu pai morreu”, diz, segurando o choro.
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Adotada com apenas três dias, descobriu sua origem em uma ligação anônima. “Até hoje não sei quem foi que me ligou. Fiquei dois dias fora do ar, mas entendi a decisão dos meus pais. Ter nascido do coração deles foi a melhor coisa que poderia ter me acontecido na vida”, afirma a paulistana, que nunca teve curiosidade em procurar a família biológica.
Disposta a ganhar o prêmio para conseguir a casa própria, a escorpiana pretende não perder o foco:
“Meu verdadeiro amigo, lá dentro, é R$ 1,5 milhão. Sou calculista, eu capto, tenho radar de percepção para chegar no meu objetivo. É um jogo de xadrez”.
Na despedida para o confinamento, dá um aviso à mãe: “Nem Jesus agradou todo mundo. Não sou eu que vou ser exceção. Não sofre”. Dona Yara faz uma última recomendação: “Não esquece que você é casada”. Denis, que sorri com o pedido da sogra, abraça Thelma e diz: “Estou te esperando com ou sem o prêmio. Então, seja muito feliz lá dentro”.
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