Em quase todos os "BBBs”, surgem palavras-chiclete. Elas brotam da boca de um participante e, sem que se saiba muito bem como, são reproduzidas por todos dentro e fora da casa. Para o bem ou para o mal, quem cola nessas palavras estoura.
Em 2015, o vocabulário pitoresco de Cézar Lima, com termos como "estrogonoficamente" e sentenças muito elaboradas, mas pouco compreensíveis, chamou a atenção. A graça e a estranheza de seus diálogos e monólogos ajudaram o participante a vencer a edição.
Em 2021, palavras e expressões voltaram a viralizar e foram usadas de maneiras diferentes: tem participante com seu dicionário próprio; outros que trazem muitas expressões regionais; e até quem tenta se agarrar àquelas palavras que já viraram características do programa. Veja, abaixo, uma amostra do dicionário do programa:
A.ni.mo.si.da.de: s.f. 1. disposição ou determinação diante de obstáculos; audácia, coragem. 2. má vontade constante; aversão, rancor, ressentimento.
Bas.cu.lho: s.m. 1. do que é pior que o lixo, sem utilidade, desprezível.
Bas.tião: s.m. 1. forma carinhosa de chamar as pessoas
Cro.chê: expressão coloquial. 1. situação enrolada. 2 situação em que uma pessoa fala muito, mas não chega a conclusões plausíveis.
Co.e.rê.ncia: s.f. 1 Ligação, harmonia, conexão ou nexo entre os fatos ou as ideias; nexo.
Fe.no.ti.pi.ca.men.te: advérbio. 1. relativo a fenótipo (conjunto de características aparentes ou observáveis e um indivíduo).
Jor.na.da: s.f. 1 - trajetória. 2. reunião de acontecimentos.
Mu.lin.ga: expressão coloquial. 1. expressão de espanto ou surpresa.
Tcha.ki tcha.ki: expressão coloquial. 1. relativa a alegria, celebração.
Em qualquer um desses casos, a linguagem é usada estrategicamente para gerar empatia, afirmação ou passar uma mensagem para o público, segundo especialistas ouvidos pelo G1. Mas ela só é bem-sucedida se vier acompanhada de uma trajetória coerente na casa, avaliam.
Algumas palavras não saem da boca dos "brothers", edição após edição, como sinônimos de virtudes que se imagina necessárias para um participante de reality. Até 2019, coração e verdade reinavam absolutas, em frases como: "essa é a minha verdade", "não vejo verdade em você", "estou jogando com coração" e "eu sou eu mesmo".
No "BBB20", coerência surgiu para disputar a preferência argumentativa dos confinados. Neste ano, muitos deles têm usado coerente ou incoerente como elogio ou afronta no jogo e justificativa de voto.
Martelar esses termos o tempo todo pode ter o efeito de convencer pela insistência, avalia Roberta Scorcio Tafner, professora e pesquisadora de "BBB" da ESPM-SP. "A Juliette repete que é verdadeira para todos os participantes, tanto os aliados quanto os adversários. Quanto mais se repete essas frases, mais as pessoas vão acreditar", diz.
"O Fiuk também tem esse discurso muito forte, do coração e da verdade. Na primeira roda de conversa que eles fizeram, ele marcou isso e convidou as pessoas para um abraço. Foi uma estratégia naquele momento em que eles tinham acabado de sair do isolamento no hotel", explica.
A estratégia pode ter dado certo na casa. Por mais de uma vez, outros participantes já classificaram Juliette como "muito verdadeira" e Fiuk como "muito coração".
Mas apenas falar não cola com o público. "Estamos falando de um programa visto 24 horas. Essas palavras têm força, mas a gente tem que levar em consideração que não é só o que é dito, o comportamento impacta muito na avaliação do participante", diz Scórcio.
Na avaliação de Laércio Ferreira, professor da Universidade Católica de Brasília e da Secretaria de Educação do Distrito Federal, se um participante marca muito esses termos, mas não age de acordo com eles, ele pode ser visto como falso ou artificial.
Muito rebuscado
Lumena é eliminada do BBB21 — Foto: Reprodução / Globo
"Fenotipicamente", "jornadas", "itinerários"... a psicóloga Lumena, última eliminada do "BBB", tinha um vocabulário todo particular na casa. Para a pesquisadora, as palavras foram escolhidas para conquistar pessoas que se identificavam com suas pautas, principalmente dos movimentos feminista, negro e LGBT.
"Ela veio com um pacote de palavras que envolvem a experiência dela como mulher e seu conhecimento. Juntou essas duas coisas e usou a fala para conquistar as pessoas com uma pauta que é muito forte fora da casa", explica.
Para a professora, a estratégia não deu certo porque sua linguagem corporal era sempre "reativa". "A palavra é uma coisa, a forma é outra. A postura e a linguagem corporal geraram um desequilíbrio com a fala."
Menos pode ser mais
Ter uma linguagem mais simples pode quebrar a barreira de aproximação com outros participantes e com o público, além de gerar empatia, concordam Scórcio e Ferreira.
Por isso, Caio e Rodolffo ganham simpatia quando utilizam expressões ligadas à vida na roça: "gaio de pau quebrando", "crochê", "coiedeira passando por riba de semente" e por aí vai. "Os vídeos deles sentados usando termos simples e bem regionais são suaves e divertidos, traz leveza pro discurso deles. De forma social e cultural, elas se imprimiram na casa", diz a professora.
Também por isso, algumas palavras usadas por Gilberto e Juliette, como basculho, moléstia e mulinga também geram curiosidade e torcida. Os adms da sister publicaram até um "dicionário juliettês" para ajudar o público de outros estados a entender as expressões usadas por ela.
"Existem pessoas que se identificam com o dialeto e/ou regionalismo de determinado participante, o que pode fazer com que ganhe o carisma do público", avalia Ferreira.
Faz o tchaki tchaki, bastião
Ter termos característicos e pessoais é uma ótima forma de ser copiado e lembrado fora da casa. Para a professora, Gilberto, Caio e Rodolffo conseguiram associar as palavras que sempre falam a significados positivos.
Com isso, é mais fácil que outros confinados queiram usá-las em momento de alegria e descontração. E também que elas virem memes nas redes sociais. O tchaki tchaki de Gilberto sempre é usado em comemorações pela casa e o bastião da dupla de goianos foi adotado por outros confinados.
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